Barroco: características, contexto histórico, autores e obras relevantes

Louise Oliveira
Louise Oliveira
Professora de Português

O barroco é um movimento cultural e artístico ocorrido entre o final do século XVI e o século XVIII. Sua origem foi em Roma, na Itália, estendendo-se por outros países europeus e algumas colônias.

Nesse período, o homem vivia um grande conflito: de um lado, a convivência com os valores renascentistas; de outro, o resgate de valores religiosos e a busca pela salvação. A literatura e as outras artes traduziam as contradições dessa tensão.

Por isso, as principais características do barroco são:

  • conflito entre fé e razão
  • consciência da transitoriedade da vida e do tempo
  • concepção trágica da vida
  • culto do contraste (vida e morte, sagrado e profano, luzes e sombras, racional e irracional etc.)
  • sensualismo e sentimento de culpa
  • carpe diem (aproveita o dia), geralmente revestido pelo conflito
  • fusionismo (fusão das visões medieval e renascentista)
  • pessimismo e feísmo (exploração da miséria da condição humana)
  • dinamismo (criar sensação de movimento, representando o período instável)
  • cultismo (linguagem rebuscada) e conceptismo (construção intelectual dos textos)

Contexto histórico do barroco

Entre os séculos XV e XVI, muitos intelectuais da época buscavam respostas racionais para as suas perguntas, baseadas na razão e não na religião.

O Renascimento desenvolveu-se nesse contexto. Houve uma renovação no tratamento de várias questões e o aumento da produção cultural, impulsionado pela imprensa.

Reforma Protestante

O sentimento nacionalista cresceu. Além disso, aumentaram as críticas a doutrinas da Igreja Católica e a determinadas práticas do clero, desencadeando o movimento de reforma religiosa conhecido como Reforma Protestante.

Esse movimento rompeu a unidade do cristianismo (católico) no Ocidente, levando ao surgimento de diversas igrejas independentes.

Reforma Católica (Contrarreforma)

Como a Igreja Católica perdia cada vez mais o seu poder e influência, ela acelerou a tomada de providências para tentar impedir o avanço das ideias protestantes, em um movimento conhecido como Contrarreforma ou Reforma Católica.

Dentre as medidas tomadas pela instituição estão a fundação da Ordem dos Jesuítas (1534), a realização do Concílio de Trento (1545 a 1563) e a volta da Inquisição (incluindo uma lista de livros proibidos aos católicos).

É nesse cenário turbulento que se encontra o homem do Barroco: dividido entre a fé e a razão, lutando internamente com questões existenciais, em um tempo de perseguições da Igreja Católica e sua luta pelo poder.

Uma das táticas adotadas pela Igreja Católica para manter sua influência foi o uso e o patrocínio da arte. Assim, a instituição religiosa influenciou fortemente o Barroco, moldando as suas características.

Pintura representando o momento em que os três reis, acompanhados por uma grande procissão, apresentam os seus presentes ao menino Jesus. Este, nos braços da mãe, parece brincar com o incenso que Gaspar lhe apresenta, ajoelhado diante dele. A cena está localizada no exterior e se passa à noite. Porém a luminosidade é nítida, e o menino Jesus irradia a luz que incide sobre os demais personagens.
Rubens, Peter Paul. A Adoração dos Magos. 1609. Óleo sobre tela.

Na Europa do Norte, o Barroco teve nuances diferentes, porque o movimento protestante ganhou mais força na região, difundindo-se por ela. Já no sul europeu, o domínio católico prevaleceu nos territórios atuais de Portugal, Espanha e Itália.

Barroco na Literatura

Na linguagem do Barroco dois estilos se destacam: o cultismo e o conceptismo.

Gôngora à esquerda e Quevedo à direita. No traje de Quevedo há uma representação da Ordem de Santiago.
Representação de Gôngora (à esquerda) e Quevedo (à direita), escritores barrocos espanhóis que influenciaram o cultismo e o conceptismo.

Cultismo ou gongorismo

O foco do cultismo é a elaboração de uma linguagem rebuscada. Para atingir esse objetivo, os autores usam:

  • variadas figuras de linguagem (metáfora, metonímia, antítese, paradoxo, hipérbole, hipérbato etc.);
  • jogos de palavras (trocadilhos, relação entre sinônimos, relação entre antônimos, semelhança de palavras com diferentes significados, perífrases);
  • linguagem culta, formal, extravagante;
  • frases muito elaboradas.

Conceptismo ou quevedismo

O foco do conceptismo é o trabalho com as ideias e os conceitos, seguindo um raciocínio lógico e valorizando a construção intelectual dos textos. Para atingir esse objetivo, os autores usam:

  • estratégias argumentativas para convencer os leitores ou ouvintes, com citações, exemplos, analogias, comparações;
  • relações de causa, consequência e condição para construir os argumentos;
  • repetição de ideias e de palavras para reforçar um conceito;
  • figuras de linguagem (metáfora, analogia, comparação, antítese etc.).

Conheça mais as figuras de linguagem.

O cultismo é mais comum na poesia e o conceptismo na prosa, mas os dois estilos podem ser usados no mesmo texto.

Barroco na Europa

Como reflexo dos impactos dos Grandes Descobrimentos, Portugal e Espanha estão entre os principais centros culturais do barroco na Europa.

Os grandes autores do barroco espanhol foram Luis de Góngora y Argote (1561-1627) e Francisco de Quevedo (1580-1645).

Por sua vez, os principais autores e obras do barroco em Portugal foram:

  • Pe. Antônio Vieira (1608-1697). Principais obras: Sermão de Santo Antônio aos Peixes (1654), Sermão da Sexagésima (1655), Sermão do Bom Ladrão (1655).
  • D. Francisco Manuel de Melo (1608-1666). Principais obras: Carta de Guia de Casados (1651), Obras Métricas (1665), Apólogos Dialogais (1721).
  • Soror Mariana Alcoforado (1640-1723): Principais obras: Cartas Portuguesas (1669).

Barroco no Brasil

O Barroco no Brasil ocorreu entre os séculos XVII e XVIII. Iniciou-se em 1601 com a obra Prosopopeia, de Bento Teixeira. Na época da colonização, o catolicismo era a religião oficial de Portugal.

Padre Antônio Vieira foi o principal escritor do barroco português e brasileiro. Além dele, os principais autores do barroco no Brasil foram:

  • Gregório de Matos (1633-1696)
  • Manuel Botelho de Oliveira (1636-1711)
  • Frei Manuel da Santa Maria de Itaparica (1704-1768)

Padre Antônio Vieira (1608-1697)

Padre Antônio Vieira nasceu em Lisboa e ainda criança foi morar no Brasil, onde passou a maior parte da sua vida. Considerado o principal escritor do barroco português, sua obra abrange as literaturas portuguesa e brasileira.

Vieira teve sólida formação intelectual e cultural. Não é por acaso que Fernando Pessoa o chamou de Imperador da Língua Portuguesa.

Sendo um brilhante orador, ele se tornou um frequente visitante das cortes portuguesas e também desempenhou papéis em missões diplomáticas em outras cortes europeias.

Membro da Ordem dos Jesuítas, Vieira dedicou-se a causas humanitárias e teve confrontos com colonos e a própria Igreja Católica na defesa de seus ideais. Foi contrário à escravização dos índios e defendeu outras causas, como a dos judeus.

O conceptismo está muito presente nos sermões de Vieira. Veja um trecho do Sermão da Sexagésima, um dos mais conhecidos sermões de Vieira, proferido na Capela Real de Lisboa em 1655.

[...] Não nego nem quero dizer que o sermão não haja de ter variedade de discursos, mas esses hão de nascer todos da mesma matéria e continuar e acabar nela. Quereis ver tudo isto com os olhos? Ora vede: Uma árvore tem raízes, tem tronco, tem ramos, tem folhas, tem varas, tem flores, tem frutos. Assim há de ser o sermão: há de ter raízes fortes e sólidas, porque há de ser fundado no Evangelho; há de ter um tronco, porque há de ter um só assunto e tratar uma só matéria; deste tronco hão de nascer diversos ramos, que são diversos discursos, mas nascidos da mesma matéria e continuados nela; estes ramos não hão de ser secos, senão cobertos de folhas, porque os discursos hão de ser vestidos e ornados de palavras.

Gregório de Matos (1633-1696)

Gregório de Matos e Guerra é considerado o primeiro grande poeta brasileiro. Nascido em Salvador e filho de família abastada, recebeu ampla formação cultural e estudou Direito na Universidade de Coimbra, em Portugal.

Os seus textos contêm influências de poetas barrocos como Quevedo e Gôngora. Mas, além disso, incorporam a vida colonial, abordando temas locais, expressões populares e termos de origem indígena e africana.

Durante a vida do escritor, seus poemas não foram publicados de forma impressa. Na época, era comum serem declamados em voz alta e memorizados. Também poderiam circular em cópias manuscritas (códices).

Sua obra divide-se em dois tipos de poesia: lírica (amorosa, filosófica ou religiosa) e satírica. Em razão de suas sátiras, ficou conhecido como “Boca do Inferno”.

Veja exemplos analisados de poemas.

Poesia lírica

Ofendi-vos, Meu Deus, bem é verdade;
É verdade, meu Deus, que hei delinquido,
Delinquido vos tenho, e ofendido,
Ofendido vos tem minha maldade.

Maldade, que encaminha à vaidade,
Vaidade, que todo me há vencido;
Vencido quero ver-me, e arrependido,
Arrependido a tanta enormidade.

Arrependido estou de coração,
De coração vos busco, dai-me abraços,
Abraços, que me rendem vossa luz.

Luz, que claro me mostra a salvação,
A salvação pretendo em tais abraços,
Misericórdia, Amor, Jesus, Jesus.

Nesse poema, o eu lírico dirige-se a Deus para se confessar. Menciona a maldade com que o ofendeu e demonstra seu desejo de ser vencido por Cristo.

Dentre as figuras de linguagem em destaque, observamos a antítese (entre arrependido e ofendido) e a anadiplose, figura pouco conhecida e que funciona desta forma: uma palavra do final de um verso é repetida no início do próximo verso.

Por exemplo: a palavra verdade finaliza o primeiro verso e começa o segundo. Esse recurso é importante para o realce de ideias, como o sentimento de angústia do eu lírico.

Poesia satírica

A cada canto um grande conselheiro,
Que nos quer governar cabana e vinha;
Não sabem governar sua cozinha,
E podem governar o mundo inteiro.


Em cada porta um bem frequente olheiro,
Que a vida do vizinho e da vizinha
Pesquisa, escuta, espreita e esquadrinha,
Para o levar à praça e ao terreiro.


Muitos mulatos desavergonhados,
Trazidos sob os pés os homens nobres,
Posta nas palmas toda a picardia.


Estupendas usuras nos mercados,
Todos os que não furtam muito pobres:
E eis aqui a cidade da Bahia.

Por sua vez, o poema satírico exemplificado contém uma crítica aos governantes. Nota-se o uso de várias figuras de linguagem, como a metonímia (cabana, vinha e cozinha), ironia (grande conselheiro) e gradação (Pesquisa, escuta, espreita e esquadrinha), que ajudam na expressividade do texto.

O barroco nas outras artes

Os principais artistas plásticos barrocos na Europa são Caravaggio, Rubens, Rembrandt e Velázquez. Em Portugal, destaca-se a pintora Josefa de Óbidos.

Uma curiosidade sobre a obra de Michelangelo Merisi da Caravaggio (1571-1610), o grande pintor italiano do Barroco: sua fama deve-se em grande parte ao realismo da sua obra. O tratamento que ele deu às figuras religiosas, por exemplo, tornou-as mais reais, por vezes enrugadas e mal trajadas.

Antes do Barroco, as figuras bíblicas eram retratadas de forma idealizada e bela. Assim, as pessoas da época ficaram impactadas com a obra.

A pintura apresenta Tomé colocando um dedo na ferida do lado de Jesus, com dois outros apóstolos assistindo a cena. Os quatro estão dispostos em um fundo neutro e escuro. Jesus irradia a luz que incide sobre os demais personagens.
Caravaggio. Tomé, o Incrédulo. 1602. Óleo sobre tela.

Existe, ainda, notória produção na arquitetura, na música, no teatro, entre outras expressões. Na música, ganham realce as composições de Vivaldi, Johann Sebastian Bach e Georg Friedrich Haendel.

No Brasil, a arte barroca se destacou na segunda metade do século XVIII, com o ciclo do ouro. Os trabalhos mais importantes são os de Aleijadinho, Manuel da Costa Ataíde e as composições sacras de Lobo de Mesquita e Marcos Coelho.

A arte barroca no Brasil tem forte influência do rococó europeu.

A pintura apresenta quatro anjos tocando diferentes instrumentos musicais. Outros dois anjos aparecem ao fundo.
Mestre Ataíde. Anjos músicos. Igreja de São Francisco, Ouro Preto, MG.

Leia também:

Referências

BOSI, Alfredo. História concisa da Literatura Brasileira. 50 ed. São Paulo: Cultrix, 2015.

CEREJA, W. R; MAGALHÃES, T. C. Português: Linguagens. 11 ed. São Paulo: Saraiva, 2016.

Atualizado em
Louise Oliveira
Louise Oliveira
Graduada em Letras pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), é professora de Língua Portuguesa, autora de materiais didáticos e revisora de textos. Apaixonada pela escrita e pelo ensino de língua materna, produz conteúdos educacionais desde 2009 e carrega o propósito de levar educação de qualidade a todos.

Veja também