O pré-modernismo é o período que reúne as produções literárias brasileiras do início do século 20 até o ano de 1922.
Considerado uma fase de transição, o pré-modernismo não é um movimento literário em si. Ele ainda está ligado às correntes do final do século 19, como o Naturalismo e o Simbolismo, mas, ao mesmo tempo, surgem autores que buscam uma expressão própria. Assim, inovam ao resgatarem temas da realidade nacional e usarem uma linguagem mais brasileira.
Os escritores que se destacam nesse período são Augusto dos Anjos, Lima Barreto, Euclides da Cunha, Graça Aranha e Monteiro Lobato. Suas obras deram voz aos segmentos marginalizados da sociedade brasileira, retratando suas lutas e dificuldades de forma crítica.
Confira as principais características do pré-modernismo:
O pré-modernismo tem como marco inicial o ano de 1902, quando foi publicada a obra Os Sertões, de Euclides da Cunha, com a temática da Guerra de Canudos.
Nesse período, o Brasil vivia grandes tensões sociais. Governantes de São Paulo e Minas Gerais concentravam o poder político, em um acordo conhecido como Política do Café com Leite, desde a década de 1890. As oligarquias desses estados eram privilegiadas enquanto outras regiões do país enfrentavam falta de investimentos.
Um exemplo foi a cultura da cana-de-açúcar no Nordeste, que estava em declínio devido à concorrência do café, cujo cultivo se expandia rapidamente em São Paulo.
Paralelamente, os escravos que conquistaram sua liberdade com a Lei Áurea (1888) ainda não haviam sido integrados ao mercado de trabalho, ficando marginalizados na sociedade.
Os imigrantes estavam substituindo os escravos como mão de obra, e as cidades cresciam rápido. Esse processo aumentou o proletariado e intensificou as desigualdades sociais.
Se, por um lado, o país havia se tornado uma república (1889), por outro suas bases econômicas e sociais ainda tinham muitas características da monarquia. Assim, várias revoltas aconteceram por causa da insatisfação das pessoas com a vida e o sistema político.
As produções literárias pré-modernistas expressaram as vozes dos grupos marginalizados da sociedade brasileira, examinando suas adversidades com um olhar crítico.
Enquanto isso, os movimentos de vanguarda ocorriam na Europa em meio às disputas políticas entre as nações imperialistas e os avanços tecnológicos, industriais e científicos.
Veja os representantes do pré-modernismo na literatura.
Euclides Rodrigues da Cunha (1866-1900) nasceu em Cantagalo, Rio de Janeiro. Foi escritor, jornalista, engenheiro e militar. Em 1896, fez a cobertura da Guerra de Canudos para o jornal Província de São Paulo (atual O Estado de S. Paulo).
Após a cobertura, escreveu sua principal obra, Os Sertões (1902), abordando o tema da guerra e do messianismo em Canudos. O livro, que também é considerado um ensaio / reportagem, é dividido em três partes: a terra, o homem e a luta.
Com base no Determinismo, uma das teorias vigentes na época, o livro faz uma relação entre a influência de fatores sociais e ambientais sobre a condição do homem. Também denuncia a situação de miséria e os massacres em decorrência do conflito.
Trecho do livro Os sertões
Canudos não se rendeu. Exemplo único em toda a História, resistiu até ao esgotamento completo. [...] Caiu no dia 5, ao entardecer, quando caíram os seus últimos defensores, que todos morreram. Eram quatro apenas: um velho, dois homens feitos e uma criança, na frente dos quais rugiam raivosamente cinco mil soldados.
José Pereira da Graça Aranha (1868-1931), escritor e diplomata do Maranhão, foi um dos fundadores da Academia Brasileira de Letras. Também participou da organização da Semana de arte Moderna de 1922.
Sua principal obra, Canaã (1902), aborda a imigração alemã no Espírito Santo.
Afonso Henriques de Lima Barreto (1881-1922) foi um escritor e jornalista nascido no Rio de Janeiro. Descendente de escravos negros e portugueses, veio de uma família de classe média do subúrbio e enfrentou preconceito racial ao longo de sua vida.
Para se sustentar, trabalhou como escriturário no Ministério da Guerra e escreveu para diversos jornais. Suas obras abordam a análise das populações suburbanas do Rio de Janeiro.
José Bento Renato Monteiro Lobato (1882-1948) foi um dos primeiros autores de literatura infantil na América Latina. Nascido em Taubaté, São Paulo, atuou também como tradutor, quadrinista, ilustrador e editor.
Na sua obra Urupês, dá vida ao famoso personagem Jeca Tatu, abordando a miséria do caboclo no Vale do Paraíba, em São Paulo.
Augusto de Carvalho Rodrigues dos Anjos (1884-1914) é considerado um dos poetas mais singulares da literatura brasileira. Nascido no Engenho do Pau d’Arco, na Paraíba, formou-se em Direito e foi professor.
Seus poemas possuem muitas influências literárias e exploram temas como a morte e o pessimismo. Carlos Drummond de Andrade foi um grande admirador de sua poesia. Ao ler seus poemas na adolescência, relatou que eram diferentes de todos os que conhecia.
Leia um trecho do poema Versos íntimos, de Augusto dos Anjos.
Versos íntimos
Vês! Ninguém assistiu ao formidável
Enterro de tua última quimera.
Somente a Ingratidão – esta pantera –
Foi tua companheira inseparável!
Acostuma-te à lama que te espera!
O Homem, que, nesta terra miserável,
Mora entre feras, sente inevitável
Necessidade de também ser fera. [...]
Na transição do século 19 para o 20, a Europa ocidental passou por profundas transformações ligadas ao capitalismo industrial. Houve inúmeros avanços tecnológicos e científicos, e a população europeia cresceu de 290 para 435 milhões de pessoas entre 1870 e 1910, segundo dados divulgados pelo historiador Eric Hobsbawn.
Nesse período, as potências capitalistas passaram a adotar uma política imperialista, expandindo seus territórios pela África, Ásia e Oceania. Isso levou a uma grande competição por mercados e recursos, que, mais tarde, contribuiria para desencadear a Primeira Guerra Mundial (1914 a 1918).
Enquanto muitos apoiavam o chamado progresso, a urbanização industrial acentuou as desigualdades e a miséria. Somente uma pequena parcela da população participava da vida política e havia insatisfação com a situação social.
O projeto de civilização entrava em crise, e os artistas da época demonstravam cada vez mais inquietude em relação ao tempo em que viviam. Existia uma descrença em relação ao tempo presente, porque ele não era, necessariamente, melhor do que o passado. Além disso, no caso na arte, o gosto do público ainda era muito voltado ao que era considerado “clássico”, acadêmico.
Essa nova realidade social desencadeia uma série de discussões sobre qual seria o papel do artista na sociedade e, também, as vanguardas – movimentos que buscam o moderno, no sentido de romper com paradigmas e criar algo totalmente novo, voltado para o futuro (vanguarda, do francês avant-garde – estar à frente).
As principais vanguardas do início do século 20 são o Futurismo, Expressionismo, Cubismo, Dadaísmo e Surrealismo. Essas novas formas de apresentar a arte eram menos harmoniosas e buscaram transgredir, ou seja, pensar o mundo de outra maneira.
As vanguardas europeias influenciaram artistas brasileiros que seriam os responsáveis pelo movimento modernista no país, cujo marco inicial foi em 1922, com a Semana de Arte moderna. O movimento implicou novas formas de escrever na literatura e de representar o mundo nas artes plásticas, por exemplo.
Em Portugal, o ano que marca o início da literatura modernista é 1915, com a criação da revista Orpheu. Entre os principais artistas portugueses que participaram desse movimento estão Fernando Pessoa, Mário de Sá Carneiro, Almada Negreiros e Miguel Torga.
A Semana de Arte Moderna, em 1922, na cidade de São Paulo, marca o fim do pré-modernismo e o início do Modernismo.
Tanto o pré-modernismo quanto o Modernismo têm interesse em temas nacionais. O pré-modernismo já começava a explorar a realidade brasileira, suas desigualdades, personagens típicos (sertanejos, caipiras, caboclos) e problemas sociais, pavimentando o caminho para o Modernismo.
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Referências
BOSI, Alfredo. História concisa da Literatura Brasileira. 50 ed. São Paulo: Cultrix, 2015.